quarta-feira, 12 de junho de 2013

O custo social do Transporte


O preço do ônibus aumentaria em São Paulo se 
as pessoas importassem?
por Natália Garcia



















Na semana passada, a tarifa de ônibus em São Paulo foi aumentada de R$ 3 para R$ 3,20, o que causou comoção entre os paulistanos e o movimento Passe Livre foi às ruas exigir que o aumento seja revisto. O argumento do prefeito Fernando Haddad para o reajuste é a inflação acumulada de 15,5% desde o último aumento na tarifa, na gestão Gilberto Kassab, em janeiro de 2011, quando a condução subiu de R$ 2,70 para R$ 3. Examinando os dados dos últimos dois anos, vemos que o aumento proposto agora por Haddad de fato está abaixo da inflação do período. Mas quando falamos de economia, dois anos não são suficientes para consolidar dados.
Em uma reportagem publicada na semana passada, o UOL mergulhou nos dados de aumento da inflação e das tarifas em São Paulo desde a criação do Plano Real. Em 1995, quando o Real entrou em circulação, o preço da passagem de ônibus era R$ 0,65. De lá para cá, a tarifa aumentou 392%, enquanto a inflação cresceu 300%. Segundo o UOL, se a tarifa de ônibus tivesse acompanhado a inflação durante todo esse período, o valor cobrado hoje seria de R$ 1,50.
Só que ainda faltam variáveis nessa conta. A economia dos transportes é bem mais complexa e foi dissecada pelo acadêmico inglês William Vickrey, que em 1996 recebeu o Prêmio de Ciências Econômicas (ou o popular Nobel de Economia). Vickrey enunciou o que ficou conhecida como a regra de ouro da economia dos transportes:
“Cada pessoa deve arcar com os custos sociais dos seus deslocamentos na cidade”
Em 1963, ele fez um estudo que apontou que a cada carro adicional fazendo uma viagem diária no horário de rush em Londres, era necessário um investimento adicional de 23 mil dólares em infraestrutura – de dinheiro público, pago por todos, vale ressaltar. Vickrey defendeu que carros em excesso saem caros demais para a cidade e acabam engolindo parte substancial do orçamento de transportes. É por isso que vemos aberrações como a Cidade do México, onde 28% dos deslocamentos são feitos de carro, a minoria, mas recebem a maioria do orçamento da Secretaria de Transportes: 75% é aplicado em infraestrutura para os automóveis.
“Nenhuma outra área norteia seus preços de maneira tão irracional, ultrapassada e desperdiça tanto dinheiro quanto a mobilidade urbana”, disse Vickrey. “Quem se locomove de carro não paga pelos congestionamentos que atrasam a maioria, os problemas de saúde pública pelo excesso de poluição e a infraestrutura mais cara per capita em relação aos transportes públicos ou mão motorizados”, explicou o economista.
Uma porção de estudos pegam carona nas ideias de Vickrey para tentar quantificar o prejuízo econômico do excesso de veículos. Em um artigo intitulado O Valor Econômico do Tempo Livre, o professor economista da PUC-SP Ladislau Dowbor tenta quantificar o dinheiro perdido em São Paulo pelo congestionamento todos os dias, levando em conta apenas as horas o tempo que pessoas ficam paradas sem produzir. Segundo ele, o PIB da cidade é de R$ 320 bilhões. Dividindo-o pela população, chega-se ao valor de uma renda per capita de R$ 29 mil reais, o que significa R$ 3,30 por hora por habitante. Considerando-se que cada um dos 6 milhões de paulistanos economicamente ativos perde, em média, 2 horas e 40 minutos se deslocando todos os dias, essa perda de tempo no trânsito significa que R$ 19,8 milhões são desperdiçados por hora. E esse dinheiro perdido está diretamente ligado ao excesso de veículos na cidade, o que é resultado de decisões histórias que nortearam a mobilidade paulistana a partir de deslocamentos individuais feitos em carro e do fato de que nenhum motorista arca com os prejuízos sociais que causa.
Dentro dessa lógica, pergunto: no bolso de quem os custos pelos deslocamentos precisam ser reajustados?
A única exceção à regra de Vickrey são os subsídios, investimentos públicos para diminuir os gastos individuais com os deslocamentos. Nesse quesito, o aumento das tarifas em São Paulo também é questionável. Desde 2005, os subsídios pagos às empresas que operam os ônibus da cidade foram superiores ao orçamento previsto. Entre 2005 e 2012, o total orçado em subsídios foi de R$ 3,2 bilhões, mas o montante pago às empresas extrapolou esse valor e fechou em R$ 4,5 bilhões.
Por que, mesmo com o aumento dos subsídios, o valor da passagem segue aumentando? Pelo que os usuários de ônibus estão pagando? Certamente não é por um sistema que melhora a cada ano. Ao contrário, estamos consolidando um paradigma de desperdício de dinheiro, em que a maioria arca com os gastos dos deslocamentos da minoria e ninguém sai, fisicamente, do lugar.
Claro que a resposta para esse problema não é simples. Não basta, simplesmente, sobrecarregar os motoristas de carros de encargos que paguem por seus custos sociais sem, em contrapartida, melhorar a rede de transportes públicos. Mas é fato que, ao aumentar a tarifa dos ônibus e culpar a inflação, Haddad oculta parte importante da economia dos transportes. E se esquece de algo que foi frisado no discurso de posse do ex-prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa em 1998. “Mobilidade é uma questão política. Os aspectos técnicos são fáceis de resolver. Difícil é escolher, politicamente, quem será beneficiado”.
Foto: Gabriela Batista
fonte: planetasustentável.abril.com.br

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