sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Documentário examina lobby da indústria automotiva contra bicicletas


Documentário investiga lobby da indústria automotiva contra bicicletas

Diretor sueco gravou parte do documentário na capital paulista

por SABRINA DURAN






Diretor Fredrik Gertten durante gravação do documentário (Foto: Michel Thomas)


Todos os anos, 1,3 milhão de pessoas morrem em decorrência de colisões no trânsito em todo o mundo, e outras 50 milhões ficam feridas. No Brasil, a morte no trânsito é a primeira causa de óbito por causas externas entre jovens e adultos jovens. Entre todas as faixas etárias, foram 40 mil casos em 2010, 260 mil internações em 2011 e custos de R$ 200 milhões para o Sistema Único de Saúde (SUS). Só no estado de São Paulo, entre 2006 e 2011, quase 100 mil pessoas morreram em decorrência da poluição atmosférica. A causa de 70% a 90% dessa poluição é o excesso de veículos motorizados nos centros urbanos.

Há um bilhão de carros no mundo hoje. Em 2020, serão dois bilhões.

Diante de números tão alarmantes e de uma qualidade de vida que se deteriora a cada dia nos centros urbanos, o diretor sueco Fredrik Gertten resolveu fazer alguma coisa e mobilizar outras pessoas a fazerem com ele. O resultado é o documentário Bikes vs Cars, que teve seu trailer lançado no dia 22 de setembro.



Movimento global

Não é apenas um documentário, explica o diretor, mas um movimento global. "Este documentário é feito para ser usado como um motor que nos ajuda a pensar que a mudança é necessária e possível. O filme irá investigar as políticas que mantêm o modelo do carro prosperando", ele escreve.


Em sua investigação, Gertten mostra os impactos da cultura carrocrata para a sociedade e as diferentes manobras do poder público para retirar o já escasso espaço das bicicletas para entregá-lo aos carros. Em diferentes partes do mundo, o diretor registrou como ciclistas estão resistindo aos avanços dessa indústria e ocupando, de forma ativa e criativa, o espaço que lhes é de direito. Na capital paulista, o diretor registrou momentos da Massa Crítica, e entrevistou a jornalista e ciclista Aline Cavalcante e a urbanista Raquel Rolnik.


Cartaz feito pela artista Rebeca Mendez para o documentário (Foto: Reprodução)


As tetas da indústria

Não apenas as pessoas se tornaram dependentes dos carros nos centros urbanos como também - e principalmente - os governos, que mamam largamente nas tetas da indústria automotiva. Segundo levantamento feito pela revista Época em 2011, a indústria de carros é, de longe, "a maior unidade arrecadatória da República". Entre tributos federais e estaduais, multas municipais e receitas com pedágios, as três esferas do governo arrecadaram, naquele ano, mais de R$ 81 bilhões, valor equivalente ao PIB do Uruguai.

Não à toa, mesmo num cenário de caos da mobilidade, o governo federal anunciou medidaem agosto de 2011 que reduz, até 2016, a alíquota de IPI para fabricantes de veículos instalados no Brasil. O objetivo da medida era aquecer a produção. Com o crédito facilitado para a compra de automóveis, o resultado não poderia ser outro: as vendas no mercado brasileiro batem recordes constantes.

Um dos pontos mais importantes da investigação de Gertten é, sem dúvida, o financiamento multibilionário dos governos pela indústria automotiva, e o lobby dos fabricantes sobre os gestores públicos no que diz respeito ao planejamento das cidades. "Os políticos ousam desafiar os lobistas?", pergunta o diretor. A resposta, ao que parece, está nas ruas atravancando o trânsito e empesteando o ar com monóxido de carbono.


Financiamento coletivo

O documentário Bikes vs Cars ainda não está pronto. Faltam, segundo o diretor, a pós-produção e atividades de lançamento e divulgação. No dia 22 de setembro, Gertten lançou o projeto no site de financiamento coletivo Kickstarter. O valor pedido para a conclusão do filme é de US$ 50 mil, e para cada cota de patrocínio há uma recompensa diferente. A arrecadação vai até dia 1 de novembro.

No site oficial do projeto é possível cadastrar-se para receber informativos periódicos e tornar-se um voluntário, não apenas divulgando a ideia do documentário, mas criando atividades e eventos locais relacionados ao uso da bicicleta na cidade como meio de transporte.



segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Paris cria mais de 500km de ruas de convivência onde pedestres e ciclistas tem sempre prioridade sobre veículos motorizados.

Cidade para as pessoas: Seguindo a filosofia de que os veículos motorizados são intrusos no trânsito (e não o pedestre e o ciclista), Paris cria faixas de pedestres "pixeladas", restringe a velocidade máxima dos automóveis para 30 km/h e cria 560 km de ruas onde pedestres e bicicletas sempre terão prioridade sobre os carros e motocicletas.



(testo original em espanhol)


Paris inventa los pasos de peatones pixelados


Paris inventa los pasos de peatones pixelados
Paris inventa los pasos de peatones pixelados 


A partir del 1 de septiembre, París introducirá novedades en su tráfico urbano con reglamentaciones nunca vistas y límites de velocidad de 30 y 20 km/h en 560 km de sus calles, donde peatones y bicicletas tendrán siempre preferencia sobre coches... y motos.

FORMULAMOTO.ES


La “ciudad de la luz” introducirá cambios en la regulación del tráfico urbano el próximo septiembre con muchas “sombras” en el apartado de dos ruedas. Una ciudad en la que los scooter (de dos y tres ruedas) y las motos son un componente esencial para garantizar la fluidez de la circulación en sus calles, ahora totalmente equipara estos vehículos a los de cuatro ruedas.
En zonas residenciales y entorno de colegios, se restringirá el tráfico a los 30 km/h, mientras que se crean “zonas de encuentro” o áreas de convivencia, donde se limita a 20 km/h, siempre teniendo en cuenta que peatones y bicicletas son los que cuentan con la preferencia.
En estas últimas se crean pasos de peatones pixelados, siguiendo la filosofía que son los vehículos a motor los elementos intrusos en el tráfico y no los peatones. Se ha preferido esta alternativa a la conversión total en peatonales de numerosas calles. Por otro lado, en este mismo ámbito y siguiendo determinadas señales, los ciclistas podrán circular en sentido contrario en calles de único sentido y girar a la derecha con semáforo rojo.
¿Crees que se debería haber apostado más por los vehículos de dos ruedas? Déjanos tus comentarios.




fonte: http://www.formulamoto.es/


sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Há futuro para a Bicicleta na cidade?


Por que cidades voltadas ao ciclismo são o futuro?



                              O Parque Olímpico de Esculturas, em Seattle, Washington, projetado por Weiss Manfredi.
 Imagem © Benjamin Benschneider

O lançamento, em 2010, do “Boris Bike” - esquema de compartilhamento de bicicletas de Londres, em homenagem ao prefeito Boris Johnson - foi a indicação mais clara até agora de que o ciclismo já não se reduz a uma minoria de fanáticos, mas um modo saudável, eficiente e sustentável de transporte que planejadores urbanos devem utilizar em seu arsenal. Existem hoje mais de 8.000 bicicletas e 550 estações de compartilhamento no centro de Londres. E este comportamento não é limitado à cidade: segundo o Wikipedia, existem 535 sistemas deste tipo em 49 países, utilizando mais de meio milhão de bicicletas em todo o mundo.


No entanto, a verdadeira questão é: será que as bicicletas realmente mudam a cidade? Será que isso resultará em novas formas urbanas ou, como o título do novo livro do acadêmico australiano Dr. Steven Fleming prevê, uma "Cycle Space"? Como Fleming, acredito que sim. Acredito que o ciclismo pode ser o catalisador para um renascimento urbano no século 21.


Leia como, a seguir...



Recentemente, fiquei quatro semanas fora do escritório para pedalar de Chicago à Nova York e visitar as cidades ao longo do caminho. Minha viagem de 1.300 milhas fazia parte de uma expedição em grupo chamada P2P, que saiu de Portland, Oregon até Portland Place, em Londres (leia mais sobre isso na portlandtoportland.org). O objetivo foi relatar, de volta ao Reino Unido e Londres, a cultura da cidades voltadas ao ciclismo americanas e as iniciativas políticas que estão surgindo nos Estados Unidos.


                             Um ciclista na cidade de Nova York. Image © Grant Smith, via ING Media

O que nos impressionou foi a velocidade do progresso. Quando estávamos em Chicago no final de junho, a cidade lançou seu próprio esquema de compartilhamento de bicicletas. Nova York já possui um. As estações de compartilhamento trazem infraestruturas cicloviárias tangíveis às ruas da cidade. Ciclofaixas e ciclovias segregadas começaram a proliferar. Ferrovias abandonadas estão sendo aproveitados como trilhas de lazer e, em alguns casos, vem funcionando bem para os viajantes também. Indianapolis terminou recentemente sua “Trilha Cultural", um ciclo de transporte ativo que liga os cinco distritos centrais da cidade.


No final de minha viagem, ocorreu-me que esta explosão no ciclismo, deve ser inserida em um contexto histórico, a fim de permitir que os políticos e o público reconheçam a dimensão da oportunidade e a mudança que isso pode trazer às nossa cidades e vidas.


                   Bicicletário Union Station em Washington DC. Cortesia de KGP design

Como exemplo, peguemos Londres em 1667, um ano após o grande incêndio de 1666. Uma lei do Parlamento foi sancionada, para assegurar que os edifícios fossem construídos de tijolos e não de madeira (uma lei que antecedeu o fogo, mas que não havia sido executada). Claro, o fogo e a devastação resultante significaram que grande parte de Londres teve de ser reconstruída, e que essas construções seriam de tijolos.


No século XX, o modernismo de Le Corbusier acabou por ter um impacto monumental nas ruas e no skyline de Londres. Novamente, o catalisador foi, em partes, um desastre - os estragos produzidos pela Guerra e a necessidade de reconstrução rápida - e a solução foi política. As casas geminadas em ruínas, com seus quintais e latrinas foram associadas com a pobreza e as condições precárias de vida. Modernidade e a produção em massa de casas demonstraram otimismo, e um compromisso com aqueles que haviam sobrevivido à guerra. Foi uma dimensão tangível do Estado de Bem Estar recém-criado.


Claro que o modelo tabula rasa não era necessário. Foi ideológico. Mas trouxe consigo apartamentos com cozinhas equipadas, lavatórios e banheiros. Isto levou à gentrificação gradual das ruas restantes. Banheiros internos foram montados, e dormitórios e copas foram convertidos em banheiros e cozinhas no estoque de habitações remanescentes do século 19.


Mas é o trabalho de Joseph Bazalgette, o engenheiro-chefe do Conselho Metropolitano de Obras, que se destaca para mim - não apenas por sua contribuição com a saúde pública, mas também para seus potenciais paralelos ao espaço para o cliclsmo ("Cycle Space"). Durante a maior parte de sua história, Londres tinha sido associada a condições precárias de vida e doenças. No final dos anos 1850, a escala da cidade foi piorando as coisas: o esgoto de Londres era depositado no rio Tâmisa, de onde a água potável da cidade estava sendo recolhida. A solução de Bazalgette foi construir uma série de esgotos que correriam paralelos ao Rio, ao norte e ao sul deste, coletando o esgoto e garantindo que a água retirada do rio fosse realmente potável.


                       Cortesia de SewerHistory.org



                          Cortesia de SewerHistory.org

Essa façanha monumental de engenharia nos oferece o melhor precedente para o impacto que a bicicleta pode ter em Londres ou em qualquer cidade. As bicicletas nos oferecem, pela primeira vez em mais de um século e meio, a oportunidade de construir uma infraestrutura que trará consigo melhorias significativas de saúde pública. Em nosso mundo centrado nos automóveis, temos níveis sem precedentes de problemas de saúde - obesidade, diabetes, etc - todos associados com os nossos estilos de vida sedentários. O ciclismo deve significar uma população mais apta e uma maior expectativa de vida, o que aliviaria gastos dos Sistemas Públicos de Saúde e traria enormes benefícios econômicos. Além de reduzir, também, o consumo de energia.


Do ponto de vista de um arquiteto, porém, a questão permanece: como as cidades "pedaláveis" devem parecer?


O dia do funeral de Margaret Thatcher, na Catedral de St.Paul me deu uma indicação. Por razões de segurança, grande parte da Square Mile foi fechada ao tráfego de veículos e as ruas foram preservadas para os pedestres e ciclistas. O que me lembro daquele dia foi a sensação de calma, como era silencioso, e como a rua parecia realmente amigável. Por um breve momento, a esfera pública foi excepcionalmente diferente. Imaginem: embora possa não ser possível proibir o carro de imediato, deveria ser possível manter fora os veículos pesados ​​e vans de entrega durante o dia, quando o seu impacto sobre o ambiente físico e a segurança de pedestres e ciclistas é mais evidente.


                           Bike Hanger, uma proposta para a cidade de Seul. Imagem Cortesia de MANIFESTO Architecture P.C.



                              O grande bicicletário próximo à Estação Central de Amsterdam. Imagem © Flickr User CC jthornett

Imagine que os pontos de compartilhamento de bicicletas fora das estações de trem e em espaços públicos estratégicos possam incorporar estacionamentos de bicicletas particulares. Assim, a cidade cicloviária traria consigo um novo tipo de construção - os bicicletários de vários andares. Fietsenstalling, um grande bicicletário, nos arredores da estação Central de Trem de Amsterdam, com suas plataformas de aço suspensas sobre o canal, é um modelo exemplar. Sua presença é muito didática e persuasiva.


E imagine se - em vez das atuais ciclofaixas londrinas, atualmente apenas faixas azuis pintadas no canto das vias de automóveis - as cidades e vilas de Londres estivessem conectadas por uma série de rotas segregadas de transporte ativo? O que estas poderiam parecer? Um esquema que nosso escritório projetou para um concurso em 1998 pode servir como um bom modelo. Na época, o “Park + Jog” foi tratado como uma curiosidade; ainda que o descrevemos como um "esquema utópico". Mas, hoje em dia, parece cada vez menos fantasioso.


Imaginamos um trecho de 1 quilômetro de pistas duplas entre a Universidade de Salford e o centro da cidade de Manchester como um parque linear (com 4 pistas). Uma delas seria coberta de grama, outro um canal de água, outra com areia e a último como uma pista de corrida. Os usuários deixariam seus automóveis em um estacionamento de vários andares, denominado Car (P)Ark. O intercâmbio incluía também uma estação de trem suburbano, estações de aluguel de bicicletas, estábulos, uma garagem de barcos e vestiários. Do Car (P)Ark os usuários iriam à leste para caminhar, correr, andar de bicicleta, patins, fazer equitação, natação e remo. Ele terminaria no Suit Park, onde seria possível tomar banho, trocar-se e tomar um café. Oito horas depois, a caminho de casa, os passageiros depositariam suas roupas e voltariam através do Parque, para recolher seus automóveis ou pegar um trem. O esquema pode ser estendido para cada uma das vias radiais em Manchester e os intervalos destes Parques poderiam estar conectados, completando uma infraestrutura verde abrangente.


                 Renderização da proposta Park + Jog, de 1998. Imagem Cortesia de Henley Halebrown Rorrison Architects



                  Renderização da proposta Park + Jog, de 1998. Imagem Cortesia de Henley Halebrown Rorrison Architects

O que é notável sobre estes parques é o impacto positivo que podem ter em suas vizinhanças, especialmente quando se consideram as alternativas. Com as estradas, seja uma via dupla ou uma rua local, sempre vem o tráfego pesado, barulho e poluição, às custa daqueles que vivem e trabalham em torno delas. Há rodovias em perímetros urbanos que renunciam às lojas, cafés e restaurantes, elementos que geram uma vida urbana. Na escala das vias duplicadas, a A40, que rasga a região oeste de Londres, ilustra bem os malefícios à cidade. Esta avenida residencial da década de 20 transformou-se em uma zona pobre em volta de uma estrada congestionada. Estas zonas carecem da "densidade" do centro da cidade e do espaço dos subúrbios. E, a cada onda sucessiva de desenvolvimento de Greenfield, contribui-se para a expansão deste espaço pouco atrativo.


Rotas de transporte ativo e parques lineares, por outro lado, regeneram seus arredores, trazendo atividade e valor para as áreas carentes da cidade. Também alteram radicalmente a situação política para o subúrbio e seus inevitáveis deslocamentos diários. Claro que, a criação dessas redes verdes não deve ser às custas dos motoristas. Em 10 de Julho, Peter Hendy, da Comissão de Transportes de Londres, lançou um estudo para a cidade, prevendo o enterramento de seções dos anéis viários Norte e Sul, além de trechos da rodovia próxima ao Tamisa. A iniciativa criaria parques lineares na superfície, como fez o Big Dig em Boston.


                              O Parque Olímpico de Esculturas, em Seattle, Washington, projetado por Weiss Manfredi. 
Imagem © Benjamin Benschneider

Embora originalmente concebido para Manchester, acredito que o Park+Jog poderia ser adaptado a qualquer cidade no mundo e servir de exemplo de como tais espaços poderiam lançar as bases ideológicas para mudar nossas cidades para melhor. Combinando novos métodos de transporte que incentivam os princípios de um estilo de vida saudável com as tradicionais vias pode-se elevar os valores da terra, atrair investimentos e ativar o ambiente urbano. A revolução social que Bazalgette ofereceu a Londres no século 19, as bicicletas podem trazer, não só para Londres, mas para cidades de todo o mundo, no século 21.



Simon Henley é professor, autor do livro bem recebido A Arquitetura de estacionamento (The Architecture of Parking), e co-fundador do estúdio londrino Henley Halebrown Rorrison (HHbR). Sua coluna, London Calling, observa o cotidiano de Londres e sua realidade, sua cultura arquitetônica e seu papel como um centro global; acima de tudo, explora como Londres está influenciando projetos em todos os lugares, ao mesmo tempo que vem sendo desafiada a partir de dentro. Você pode segui-lo @ SiHenleyHHbR e ser um fã de sua página no Facebook, HHbR Architecture.




segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A nova Bicicleta: reinventando a roda (que já não é mais redonda)

Quem disse que a roda é redonda?

Um chinês, Guan Baihua, inventou uma nova bicicleta, diferente de tudo o que você já viu. 
Ao contrário de rodas circulares, estas rodas não têm raio definido. Em vez de terem um diâmetro invariável, as rodas "ovais" continuam a uma altura constante.





Ele até patenteou o seu novo design caso a nova roda "pegue".

terça-feira, 3 de setembro de 2013

A doença urbana de todos nós


A doença urbana tem a ver com o transporte


Carlos Dora, 
coordenador do Departamento de Saúde Pública e Meio Ambiente
 da Organização Mundial de Saúde (OMS)

Oferecer um sistema de transporte que dê opções para a população não é um fator positivo apenas para a mobilidade urbana: é questão de saúde. Cidades e países que investem em modelos de desenvolvimento sustentável veem índices de obesidade e doenças cardíacas caírem, além da redução de poluição do ar e melhora da qualidade de vida. As implicações das políticas públicas na saúde são um dos trabalhos do médico gaúcho Carlos Dora, coordenador do Departamento de Saúde Pública e Meio Ambiente da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Para isso, ele analisa prioritariamente quatro setores da economia – energia, transporte, habitação e setor extrativo – e seus riscos para a saúde. “O que eu faço é colocar todos esses riscos num conjunto que respondem como é que as alternativas de políticas públicas podem prevenir doenças”, explica.
Dora esteve no Brasil no começo de julho, quando participou do Seminário da Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU) em São Paulo. Em sua palestra, o médico analisou os impactos de um sistema de transporte BRT (Bus Rapid System, modelo de transporte coletivo com circulação em faixas exclusivas ou canaletas) na saúde.

É possível criar qualidade de vida e saúde urbana?
A doença urbana, que é causa de morte, é a doença não transmissível. Suas raízes são a poluição do ar – que causa doenças do coração e do pulmão –, a falta de atividades físicas – que dá diabete, doenças do coração e câncer – e o acidente de tráfego. Todas essas coisas têm a ver com transporte e com a opção que a gente tem por um meio ou por outro.

É possível quantificar a relação entre um tipo de transporte e o que se ganha com ele em termos de saúde?
Com o BRT a gente está quase lá, mas já foi realizado com a bicicleta. A gente tem na OMS softwares para calcular quanto um prefeito investe em pista ciclável, quanto ele ganha em termos de saúde e o que isso quantifica em termos de dinheiro. Saúde a gente pode transformar em dinheiro: menos consultas, menos tempo perdido para o trabalho, menos medicamentos. A gente já tem tanto para andar de bicicleta, a estrutura ciclável, quanto para pedestre, porque também já tiveram tantos estudos que olharam os impactos das intervenções urbanas em benefício da saúde que a gente conseguiu fazer isso.

Por que investir em estudos relacionando saúde e BRT?
Estão fazendo todo esse monte de BRTs novos [no Brasil]. É uma grande oportunidade de demonstrar que isso é melhor que outras alternativas. E tem a questão do conforto. A gente caminhando ou andando de bicicleta em uma cidade limpa, que não tem poluição de ar, é muito mais confortável. Ou não tem o risco, o susto do trânsito. Não é só ter o acidente, mas o medo de ter um, e se proteger e correr para atravessar a rua.

Muitas cidades sofrem com o esvaziamento dos espaços públicos, pessoas com medo de viver a cidade por causa da falta de segurança. Como promover a ocupação, levar as pessoas para as ruas?
É um círculo vicioso. Você tem medo que o seu filho tenha um acidente de tráfego na ida para o colégio, então, você entra no carro para levá-lo. Quanto mais tem gente no carro indo levar o filho para a escola, há mais risco de acidente. Isso se retroalimenta. A mesma coisa é a ocupação da cidade pelos pedestres. Aí a causa, eu acho, é porque a cidade é planificada para o carro. Um transporte público com espaço para pedestre e bicicleta cria equidade. Além de criar saúde, igualdade e outro ponto principal, que é a questão de indicadores de saúde para sistemas de transporte, para contabilidade.

Como desenvolver esses indicadores?
O sistema de saúde é muito rico de indicadores e o sistema de transporte também. Tem que fazer os vínculos. Como OMS, eu pego onde tem evidência científica que me diz onde é que está a conexão. O que a gente está fazendo é trabalhar isso como objetivos para o desenvolvimento sustentável, exatamente para ter alguns indicadores que falem dessa questão de cidade, transporte, saúde e desenvolvimento.

Existem exemplos que podem ser copiados?
Há muita coisa boa lá fora e muita coisa boa no Brasil e América Latina. Tem muita solução e muito erro também. Um exemplo bonito é do Rio de Janeiro: pega o ar quente do chão para mover o ventilador que refresca o ônibus. Não precisa de ar condicionado que não é limpo e causa doenças, até mesmo severas, e não dá para instalar em cada cabinezinha. Uma das soluções inteligentes é essa e você tem muitos mecanismos virtuosos que pode utilizar.

No caso dos ônibus, muitas cidades estão apostando em modelos híbridos.
Eu acho que a gente tem que ter uma coisa que seja factível. Um ônibus limpo, que tenha condições de circular com rapidez e segurança e que dê acesso aos pedestres e ciclistas. Se o motor tem que ser híbrido ou não, não vejo porque gastar tanto mais. Eu diria que o critério principal é esse do BRT: alta qualidade, ser limpo, passar na hora, dar informação, ter segurança, acesso, bem planificado. Todo esse pacote é que dá uma característica ao ambiente urbano.

E na Europa, que possui redes de transporte multimodais estruturadas, o que há para se inspirar?
A lição maior da Europa é que hoje em dia andar de bicicleta virou chique, é moda. Quando comecei a trabalhar com saúde e transporte, na década de 90, todo mundo ria e achava divertidíssimo, mas diziam ‘isso não é transporte’. Hoje é automático e é sinal de que você tem um sistema de transporte de elite, top. As pistas cicláveis são em lugares agradáveis e há espaço para pedestre. O que se viu na Europa é que, inicialmente, havia medo em ter espaço para pedestre ou para transporte público e diminuir os negócios. Na verdade, foi ao contrário, tanto em cidades pequenas quanto grandes. O espaço para pessoas melhora até os negócios, sobretudo essa coisa de venda e bares. Em termos econômicos, a cidade se torna mais atraente e atrai gente mais inteligente, mais bem preparada e que leva a cidade adiante. É uma coisa que você não mede no sistema de transporte, mas eu acho que deveria medir.
*A repórter viajou a convite da NTU
por FERNANDA TRISOTTO / fonte: gazetadopovo.com.br